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Dom Belisário fala em entrevista a CNBB sobre o desafio da interculturalidade entre as diversas etni


Foto: CNBB

Nesta terça-feira, 15 de outubro, na segunda semana do Sínodo papa Amazônia, em Roma, o entrevistado do jornalista Silvonei José, no Facebook, foi o arcebispo de São Luís do Maranhão, dom José Belisário da Silva, que destacou a diversidade dos povos indígenas na Amazônia.

Leia a entrevista na íntegra:

Silvonei José: Que avaliação o senhor faria da situação até esse momento e aquilo que brota no seu coração depois de tantas falas e proposições dos nossos padres sinodais?

Dom Belisário:Nós estamos num momento de muita escuta, de muita atenção. E uma das coisas que eu estou admirado é como essa Amazônia é grande e como ela é diversificada. Quantos povos, quantas etnias moram aí na Amazônia. Então, a importância da interculturalidade que eu começo a entender que realmente nós precisamos ser na Amazônia realmente interculturais.

Como se realiza essa perspectiva intercultural?

Primeiro precisamos conhecer a realidade, conhecer as pessoas que aí estão. Eu sou propriamente do pré-amazônia, do Maranhão. O Maranhão é uma região que já está em contato com a Europa, desde o começo, digamos assim, da chegada dos Europeus aí nessa região. Então, o Maranhão, de certa maneira, nós já temos uma caminhada de 300 a 400 anos. No Maranhão, nós temos 7 povos indígenas. Alguns já estão em contato direto, que é o caso dos Guajajaras, há mais de 300 anos. É um povo bastante numeroso, mas, por incrível que pareça, nós temos ainda um povo dentro do Maranhão, na reserva que está ali perto do Pará, que não quer entrar em contato com os não indígenas, que são os Uauaguajar, que estão na reserva do Gurupi. Só para mostrar como a nossa realidade realmente é complexa. De outro lado, nós temos essa grande região, essas grandes florestas, essas grandes reservas que estão, em uma parte, sendo desflorestada. O caso do Maranhão é um péssimo exemplo. Mas, de outro lado, nós temos as grandes cidades. Temos, começando por Manaus, que é uma cidade enorme. 80% da população daquele Estado mora na capital e também o PIB amazonense é igual ao Maranhão também. No Maranhão, a ilha de São Luís concentra uma grande parte da população e do seu PIB. Então, isso tudo mostra que a nossa realidade Pan-Amazônica, também dos países vizinhos, é uma realidade complexa que não pode ser reduzida com poucas palavras.

Como enfrentar o que o senhor estava dizendo também destes povos invisíveis e que não querem o contato? Como é que se comporta diante dessa realidade?

Primeiro lugar, nós temos que respeitá-los. Se eles não querem entrar em contato conosco, que a gente respeite essa vontade deles. Parece-me que são diversos povos. No Maranhão, nós temos esse caso os Uauaguajá. O grande risco no caso do Maranhão são os madeireiros. Se entrarem em contato com os Uauaguajá é bem possível que eles levem uma desvantagem enorme. É um povo muito pequeno, muito reduzido e eles são nômades. Então eles não têm propriamente uma aldeia, não tem propriamente uma casa. Então, eles são muito, muito vulneráveis. E a gente sabe que um madeireiro é uma pessoa que quando tem contato é um contato violento, agressivo, de matar mesmo.

O que responder àquelas pessoas que dizem que os índios têm muitas terras no Brasil?

Isso é uma afirmação inadequada. Imagine os latifundiários brasileiros ou as grandes

empresas, eles também têm muitas terras. Os indígenas brasileiros moram ali, eles cuidam de tudo isso. Eu acho que os indígenas deveriam receber um prêmio por conservarem a natureza para nós. Eles são grandes conservadores da mata da Amazônia e nós sabemos a importância dessa conservação para o mundo inteiro.

Aqui no Sínodo nós não falamos só em problemas indígenas, mas também das pessoas da Amazônia.

Nós temos uma preocupação enorme com todas as pessoas que moram aí e, de fato, eu pessoalmente, moro numa região muito urbanizada que é a ilha de São Luís. Além de São Luís, temos mais três municípios dentro da ilha. E as nossas cidades têm uma péssima qualidade de vida, praticamente o saneamento básico é muito precário. Ananindeua, Belém, por exemplo, de cidades de péssimo saneamento, mas também São Luís e aquelas cidades vizinhas, São José do Ribamar, Paço do Lumiar e Raposa. Uns 60% da nossa população não têm emprego, são desempregados. Pessoas que nunca propriamente tiveram uma carteira assinada. Então, isso tudo é um grande problema para nós e a questão do solo urbano é algo de se preocupar. Os pobres para eles terem um lugar onde se estabelecer, geralmente, têm que recorrer à ocupação, que outros falam que é invasão. Não propriamente uma invasão, é um direito humano você ter um lugarzinho para você colocar o pé e fazer uma casa para morar. Isso é um direito básico e infelizmente o poder público não dá conta, não acompanha essa questão.

Nós estamos chegando a quase metade dos trabalhos sinodais, que fotografia o senhor faria até este momento?

Nesse momento nós temos escutado com muita atenção e muita paciência, são muitas pessoas e eu chamaria atenção à voz das mulheres dentro do Sínodo e a voz dos habitantes originários da Amazônia. Mas também nós temos escutado a história emocionante de missionários que têm dado suas vidas para os povos da Amazônia. Então, o que eu espero daqui para frente é que nós tomemos toda essa escuta e transformemos isso em um programa para a continuidade e para novos caminhos para a Igreja na Amazônia e por uma ecologia integral, porque afinal é a proposta do Sínodo.

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